sexta-feira, 23 de março de 2012

Depoimento de Cláudio Antônio de Almeida

DEU BODE !!!

Falar em Manoel José de Almeida, normalmente é papo bom. Tem também as “cositas mas tristes”, coisas da política, mas essas eu vou reservar para outra oportunidade. Falar de coisa engraçada é bom e esse papo do BODE, quase levou a vida de meu pai. Essa foi ele mesmo quem me contou.
Eu já disse que ele adorava avião. As vezes os pilotos deixavam que ele segurasse o macho do avião e conduzisse a aeronave por algumas horas, corrigindo somente as mudanças de traçado. E nos finais de semana, ninguém segurava o Coronel em Brasília ou mesmo em Belo Horizonte. Viajava e viajava muito, havia muito desejo em permanecer no ar, eu imaginava. É bom se distanciar dos problemas, nem que seja por algumas horas. E seu companheiro, como piloto, por muitos anos foi o Lourival. Um homem alto, meio grisalho, mulato, arredio, de pouco papo. Mas no avião, quem falava era só o Coronel e o Lourival ouvia, sem fazer qualquer comentário. Não me parecia ser um piloto seguro, mas, na média, era melhor do que, a grande maioria dos que viajavam com meu pai. Lembro-me uma vez, indo para uma cidade, próxima a Governador Valadares, e o campo de pouso era cercado, de ambos os lados, por postes de madeira e arame farpado. Era uma grande festa na cidade e meu pai tinha assumido o compromisso de lá estar. O piloto sobrevoou o local e disse a meu pai: nesse campo eu não desço. É muito perigoso, mande o Prefeito tirar essa cerca dali. E seguimos para Governador Valadares. De lá, meu pai ligou para o Prefeito daquela cidadezinha, informando da opinião do piloto. Impossível tirar, vários aviões já pousaram aqui, sem problemas, disse o Prefeito. Era quase um quilometro de cerca para satisfazer os desejos do sr. Lourival. Mas ele era cordato e meu pai determinou: vamos voltar lá e descer. Eu sentado no banco de trás do avião, apenas acompanhava aquela insegurança do homem. Mas, já de cima da cidade, Lourival deu algumas voltas em cima do campo e, deve ter pensado – seja o que Deus quiser. E fomos nós. Era um cercado completo, para evitar a entrada de gado na pista. Assim, na cabeceira tinha cerca e arame, bem como dos lados. E descemos, quase raspando nos postes, mas pousamos. O homem suava de molhar toda a roupa. Meu pai não deu maior importância ao fato e seguiu para o seu compromisso político, mas senti que o Lourival estava mal e que seria um problema na volta. E assim ocorreu. Meu pai teve que pedir a um piloto da cidade que levasse o avião até Governador Valadares. Numa outra vez, em Pirapora, um rapaz ao pular da ponte do Rio São Francisco, bateu com a cabeça numa pedra.  O pai do rapaz, que fazia oposição a meu pai na cidade, veio ao hotel pedir para emprestar o avião e levar o acidentado a Belo Horizonte. Meu pai não pestanejou e pediu a Lourival para ir, e, se possível, voltar no mesmo dia, pois ele tinha uma agenda apertada de viagens no norte de Minas. E não é que na volta o piloto se perdeu. Mesmo, se enrolou e foi para lugares que nem posso imaginar. Eu acompanhava a angústia de meu pai, pois ele já se informara de que o avião saíra no dia anterior da Capital mineira e ainda não chegara a Pirapora, a no máximo, duas horas de viagem, dando umas erradas. Mas, um dia depois, eis que aparece o avião e o velho piloto. Era fácil viajar ao lado de meu pai, pois ele nem precisava ver as cartas náuticas, pois conhecia toda a topografia do Estado, bacias hidrográficas, montanhas, etc. E orientava com desenvoltura todos os pilotos. Alguns até, a meu ver, acreditavam demais. No norte de Minas comentavam que a grande maioria das estradas saía da cabeça de meu pai. Pois, ele pegava o tratorista, de apelido, Grilo, e sobrevoava a região. O Coronel, como topógrafo,  indicava por onde deveria passar a estrada. Normalmente ele acertava, a exceção de uma vez em que a estrada bateu numa cachoeira, mas ninguém é perfeito, né?
E o avião carregava de tudo. Tudo mesmo. Desde saco de arroz, feijão, litros de leite, galinhas vivas, cachos de banana, etc. Quando passava pela fazenda, fazia o possível para encher o avião de tudo o que fosse possível, para agradar a D. Márcia, que sempre reclamava, que tudo vai pra fazenda, mas nada volta. E ela tinha razão, pois, no natal tinha que comprar pernil, peru, etc., e na fazenda existia criações de porcos, carneiros, cavalos e gado bovino. E numa dessas, lembrou meu pai que havia prometido a um amigo, de uma propriedade próxima dali, um reprodutor de carneiro. Sim, um BODE velho. Recomendou ao administrador da fazenda, não sei se seria exatamente esse o nome da função daquela figura, pois não tinha noção de nada que ocorria dentro da propriedade. E os amigos de meu pai alertavam - cuidado com esse cara. Ta lhe furtando. Uma vez ele disse a meu pai que a onça havia comido vinte ovelhas. Engraçado que não deixou nenhuma carcaça dos animais como prova do crime do felino. Mas o Manoel de Almeida foi sempre um crédulo, sempre confiou nas pessoas. E dizia, não creio, é um homem bom. Mas pediu ao gerente para pegar o carneiro e amarrar bem as pernas do bicho com tiras de couro, pois iria levá-lo de avião. O Lourival olhava de lado e resmungava, sem que meu pai pudesse perceber o que dizia, mas a insatisfação era total naquele transporte inédito. Pois bem, amarrado o animal, a tarefa consistia em colocá-lo na parte traseira do teco-teco. Recolhia o banco e encaixava o leporino, que era muito grande, atrás dos bancos dianteiros. Precisou de alguns homens para carregar o bicho até o avião, e introduzi-lo no cubículo. A expectativa de todos era muito grande, pois um passageiro daqueles, ninguém havia presenciado na história da aviação. Mas lá estava o BODE, que berrava escandalosamente para toda a região presenciar a sua despedida da propriedade. Lourival já se encontrava dentro do avião e meu pai dava as últimas instruções ao “administrador da empresa”. Quando a gente chegava na fazenda, o cara gritava tanto, que qualquer um podia imaginar que, se continuasse assim, ficaria rouco em pouco tempo. Era seu método de demonstrar presença, competência, etc. Mas, bastava circular pela fazenda para constatar que aquilo tudo era uma grande encenação. Mas meu pai confiava nele, e muito.
O motor do avião já estava ligado e adentrou o Coronel no pássaro voador, com os berros do bode misturado ao barulho do motor da aeronave. Era uma festa de rock. O campo de pouso era relativamente pequeno, mas o bastante para levantar vôo com três pessoas, em condições normais. Mas ali estava uma carga diferente das anteriormente carregadas. O bicho gritava, e muito. Não sei a distância da fazenda onde meu pai deixaria o animal, mas quinze minutos sob aqueles ruídos, já eram insuportáveis. E lá se foi o Lourival, embalando em direção pista acima, com destino previamente definido. Percorreu cerca de duzentos metros e o animal, imenso, nervoso e desorientado diante daquela experiência inédita de vôo e do barulho do avião, conseguiu se desvencilhar das amarras nas pernas e começou a espernear, dando coices para todos os lados. Marradas também não faltaram em direção aos assentos dianteiros. E a pista já estava chegando ao final e Lourival continuava célere, tentando se desfazer o mais rápido daquela carga indesejável. E o animal estava enlouquecido, já tendo destruído o assento traseiro, as laterais do avião e provocando uivos cada vez mais estranhos. O bicho tava possuído. A menos de cem metros do final da pista, meu pai dá um grito: Pare o avião.  Mas como, dizia Lourival. PARE, gritava meu pai desesperado com a perspectiva de ter aquele animal em pleno vôo, provocando o imponderável. Sim, porque ele a cada momento se mostrava mais nervoso. E os dois arregalavam os olhos. Imagine lá no alto, se o bicho salta sobre meu pai e o piloto. As portas traseiras do avião eram frágeis e não suportariam aqueles coices violentos que estava recebendo. Acabariam cedendo. No desespero, meu pai diz: Dê um cavalo de pau. (cavalo de pau para os leigos, consiste em frear uma das rodas dianteiras do avião, fazendo-o rodar e isso, só se faz em situações emergenciais). E assim foi feito, surpreendentemente, com maestria. O piloto desacelerou completamente o avião, que rodou algumas vezes sobre o eixo da roda presa, até parar completamente. Meu pai saltou e abriu a porta traseira do avião, vendo o infeliz animal saltar e nunca mais ser visto em uma área superior a cinqüenta quilômetros. E olha que a propriedade era cercada, em grande parte, por rios. A partir daí, Lourival ficou até mais claro. O caso virou lenda na região. O Bode que voa. E a superstição cresceu quando diziam que nem era um bode, mas um cavalo alado que o Coronel transportava.

CLÁUDIO ANTÔNIO DE ALMEIDA 

quarta-feira, 21 de março de 2012

Novo depoimento de Cláudio Antônio de Almeida


TEM CAMPO DE POUSO?


Falar em MANOEL JOSÉ DE ALMEIDA, é falar também em avião. Ele faria tudo para ser um pássaro. Se não veio com asas, as criou em forma de ideal. Nem o avião lhe bastava. Precisava voar, voar, voar, ver o mundo pequeno para poder consertá-lo. E sabia que levaria tempo, não era uma só demão que atingiria a perfeição do resultado. Mas, nem Deus o fez com perfeição e, creio, nem tentou. Assim, os homens teriam um espaço para realizar algo dentro de sua dimensão.

E assim, era um predestinado a ter um avião para alcançar sua pressa. Num convite feito por D. Darcy Vargas, mulher do Presidente da República, Getúlio Vargas, para que levasse alguns atos e idéias caiomartinianas para sua instituição de amparo ao menor, na Ilha de Marambaia, no Rio de Janeiro, ocorreu o seguinte diálogo: “Coronel, como posso agradecer o que o senhor fez por aquelas crianças”. Sem pestanejar ele disse: “Quero um avião”. O homem sempre pensou grande. Mas como, onde vou arranjar, disse ela? A aeronáutica acabou de receber uma esquadrilha de aviões PIPER, respondeu ele. Foi a senha bastante para ser acionado o prestígio da Primeira Dama e entregue, no mesmo dia, o pedido alado. Nem precisa dizer como o estômago dos aeroviários se contorceu de ódio.  Ao Rio era chamado pelo Coronel Almeida, o eterno Capitão Pedrinho, para levar o pássaro verde, como veio a ser denominado, e participar da história da FUCAM.

As distâncias entre as “Caio Martins” diminuíram. Antes, para se levar o pagamento dos funcionários até o Carinhanha ou ao Ururucuia, se fazia de carro ou caminhão. Era uma tortura, pois as estradas eram ruins ou inexistiam, durante as chuvas. Os socorros, as emergências, passaram a ser corrigidas por um novo compasso. Ali, existia uma benção, mas surgiu um tormento na vida da D. Márcia de Sousa Almeida, a esposa. Naquela época os meios de comunicação eram precários e o correio e o radio, eram as válvulas de escape para reduzir a distância oral. Manoel de Almeida não temia qualquer mal tempo, pelo contrário, dificilmente enxergava uma nimbus ameaçadora. O Capitão Pedrinho era o termômetro de D. Márcia, que acreditava na sua determinação para não levantar vôo em condições de risco. E ele o fazia com determinação e corágem. Já imaginou um Capital peitar um Coronel e dizer NÃO!!! Pois o Pedrinho dizia e continuava mascando aqueles palitos de fósforo, da mesma forma, sem pestanejar, fazendo brilhar aqueles olhos verdes, naquela tez queimada de sol. E as orações de minha mãe se multiplicavam, quando as chuvas se tornavam mais intensas. E o Coronel não admitia viajar junto com a esposa. Temia uma situação de perda total, irremediável. Mas aquele bendito “pássaro verde”, cruzou o Estado de Minas, em todas as direções, sem jamais ter sofrido um acidente. O Capitão o tratava como um canário de estimação. Lavava pessoalmente o Piper, trocava o óleo, fazia uma vistoria, com um zelo digno de um carro novo  Era seu xodó.

Mas a “Caio Martins” levou o homem a novos vôos. Diante das dificuldades enfrentadas pela Instituição, não restou outra alternativa, a não ser entrar para a vida pública. Foi assim, eleito Deputado Estadual, com a quarta maior votação, para a Câmara Legislativa. E agora, como se deslocar? Agora político, as figuras mudaram. Decidiu assim comprar um avião para atender aos seus deslocamentos entre as cidades que o apoiaram na nova empreitada legislativa. Ai surgiu a figura do avião Cessna. Saudades do Capitão Pedrinho. Os pilotos brotavam de todos os lados, sem que ao menos se soubesse de sua formação aeronáutica. E foram vários. Lembro-me do Péricles. Completamente louco. Adorava passar com o avião debaixo da ponte de Pirapora. E o fazia com maestria e até um certo deboche. Era uma mistura entre a competência e a irresponsabilidade. Tinha um outro piloto que meu pai o buscava num boteco, na rua da Bahia, em Belo Horizonte. Ele sempre estava lá tomando uma cervejinha. Na inexistência de outro, o Coronel o pegava e seguia viagem. D. Márcia transpirava pavor. As vezes ela ia de carro e ele de avião, para atingir os festejos que sempre ela organizava, nas Unidades da Caio Martins. Regia o coro, apresentava temas folclóricos, preparava a recepção para as autoridades, organizava o almoço, enfim, dava o toque feminino e até o masculino. E só ela o fazia com tal competência, as vezes deixando em Belo Horizonte a filha carente das mamadas maternas, para cumprir os compromissos do Coronel. E ele sentava no assento da frente do avião. Não me lembro de ninguém ter ocupado aquele lugar, quando ele se encontrava no avião. Até o Dr. Israel Pinheiro, candidato a Governador de Minas, sentou-se atrás. Não precisa dizer do resto, mas resto mesmo. No carro mesmo, ele se sentava ao lado do motorista e, sendo este casado, jamais procurou saber se a esposa questionava aquele lugar ao lado do marido. O lugar era dele, do Coronel. Ali, ele traçava as coordenadas, juntamente com o piloto. Ele conhecia toda a topografia do Estado, com uma compreensão cartográfica invejável. Posicionava os rios e montanhas e tirava suas bases para atingir suas diretrizes de pouso.

Num dia desses de urgência, necessitando ir de Brasília a Belo Horizonte, pegou um avião de carreira e mandou, eu e duas irmãs no seu  Cessna. Como sempre, o piloto era sempre o imprevisível, o imponderável, mas sempre surgia um. E este da vez, era piloto da Novacap, órgão do Distrito Federal, e que se encontrava de férias ou, de licença (???). Mas, lá fomos nós para BH, nas mãos de um desconhecido. A viagem foi um tormento, pois o homem se perdia e demonstrava não entender as cartas náuticas, deixando-me apreensivo. Senti que a figura não tinha muita intimidade com o aparelho. Finalmente, nos aproximamos de Belo Horizonte, naquele aeroporto da Pampulha, que, para um avião de pequeno porte, era suficiente para um bom pouso. Mas não, o homenzinho, foi abaixando o nariz do avião e descendo, descendo e descendo. Eu cheguei a dizer que não ia dar, para levantar o avião, caso contrário bateria naquele aterro que antecede à pista de asfalto. Pra dizer a verdade, ele pousou, quase na quina do barranco, ainda na parte de terra, e saiu zig-zagueando pelas margens da pista. Ficamos apavorados. O medo tomou conta de todos nós. Chegamos e fomos à casa do nosso tio Astolfo, casado com a irmã de meu pai e relatamos para nossos primos as barbeiragens do piloto. Mas ficamos com receio de levar essa informação ao Coronel. Ele estava cheio de preocupações e não senti ambiente para dizer a ele o ocorrido. Para dizer a verdade, não me lembro mais o que eu e minhas irmãs fomos fazer na Capital mineira. Acho que o medo deletou  a lembrança do passeio.

Dois dias depois, voltamos ao aeroporto para retornar a Brasília. O piloto era o mesmo. O pavor, já não era contido, era pior. Estar nas mãos de um cara desse era pior do que montar na garupa de um motoqueiro alucinado. Seguimos para Brasília. Mas, tinha que acontecer algo, mas algo no meio da viagem e haja algo. O piloto começou a ter convulsões. Sim, o homem era epilético. Eu olhava pra ele e tentava segura o mancho do avião, numa forma de controlar a queda vertiginosa que a aeronave atingia. As minhas noções de aviação se restringiam a meras curiosidades dos tempos em que em Belo Horizonte se usava levar as crianças para curar o coqueluche, num vôo de avião.Coisa de mineiro. Lembro-me de ter ido na frente e fazendo aquelas perguntas todas que a criança faz a um piloto. Mas creio, não tenho certeza, aquele era um “paulistinha”, avião usado para treinamento de aprendizes de aviação. Mas continuando, o piloto babava. Sim, babava. Minhas irmãs rezavam e muito. Uma delas falava nomes de santo que eu nunca ouvira na minha vida, mas àquelas alturas, eu chamaria até os parentes dos santos para nos ajudar. Percebi, que estávamos em cima da barragem da represa de Três Marias. Sabia que lá havia um campo de pouso, asfaltado, pois uma vez passamos por lá. Segurei os braços do piloto, num desespero de fazê-lo voltar a si e pouca coisa consegui. Foi então que resolvi dar-lhe um soco no rosto. Não sei se foi essa a razão exata da volta do homem ao mundo terrestre, ou se foram os santos que ficaram tentando decidir qual deles iria interceder naquele episódio de previsão catastrófica. E ele perguntou: TEM CAMPO DE POUSO? Eu lhe disse que o que o campo estava lá, naquela posição, e indiquei, mas, creio, o avião estava perdendo muita altura. Enxergamos então um pequeno campo de pouso, de terra, mais na parte baixa da barragem. Era cercado por arame farpado e tinha algumas construções próximas. Devia ser um campo improvisado, durante a construção da Usina Hidrelétrica, e ainda em estado razoável de uso. Mas a aeronave perdia altura a cada segundo e eu me apavorava. Minhas irmãs já tinham desistido de chamar os santos e já choravam copiosamente, dizendo todas aquelas coisas que as pessoas dizem nessas situações e que, depois, não dá mais pra lembrar de nada, tais as idiossincrasias reinantes. E o avião baixava. O homem voltava a babar e eu o ajudava a segurar o mancho, imaginando poder colaborar de alguma forma. Mas conclui, não existe forma nenhuma. A coisa vai explodir e não tem jeito de evitar. E o campinho vem chegando, chegando, e aviãozinho mais parecia abanar as asas como forma de despedida. Teoricamente, não haveria forma de pousar balançando tanto as asas. Mas viemos, viemos, e o campo chegando. Ao lado da pista, uma cerca de arame farpado. Será que o avião ia caber naquele espaço do meio. Era tudo o que eu desejava.e torcia A essa altura, nem a respiração das irmãs se ouvia. Creio que minhas irmãs já teriam entregue suas vidas aos santos mais ajuizados. E o avião “placou”. Expressão usada, quando ele bate bruscamente com as rodas no chão, praticamente caindo, e não pousando. Isso que acontece hoje em algumas companhias de aviação, quase destruindo a nossa cervical. Bateu muito forte no chão e saiu de lado, carregando a cerca de arame farpado, num barulho infernal. E o avião parou. Olhei para a cara do piloto e ele não parecia ter consciência de tudo que estava acontecendo. Da boca do piloto, escorria aquela baba nojenta. O motor do avião ainda funcionava e a lateral  direita da aeronave estava presa ao arame e aos postes de madeira, que, hoje, creio, foram ali colocados por todos os parentes dos santos que minhas irmãs chamaram. Só eles iriam ter essa idéia. Mais nenhum técnico em aviação  idealizaria aquele freio.

Em pouco tempo, desceram correndo, da barragem, algumas pessoas alarmadas com toda aquela confusão provocada num lugar tão calmo e tranqüilo. Tiraram-nos de dentro do avião e comentaram que estavam apavorados com o que o avião estava aprontando no ar. Imaginaram até que o piloto estaria brincando, tais eram as loucuras observadas. Olharam o estado do piloto e arregalaram os olhos, como se vissem o conde drácula saindo do caixão. Percebi que as pernas de minhas irmãs não obedeciam aos seus comandos. Foi preciso carregá-las, até encontrar um local distante do avião para domar o susto. Todos temiam que o avião viesse a explodir, pois vazava gasolina e o lado direito do motor estava muito danificado. Seguimos até um lugar, que imagino ser o acampamento dos engenheiros, onde nos deram refrigerantes e algum alimento. E agora, como falar com nossos pais? Não querendo dar uma notícia tão desagradável para meu pai, achamos melhor comunicar, por rádio, meu tio Astolfo, que a retransmitiria por telefone a meu pai. E foi assim, feito. Ele, com aquela habilidade fantástica para dar uma notícia, contatou o Presidente da Câmara, que presidia naquele momento uma sessão: Avise ao Deputado Manoel de Almeida que. “seu avião caiu em Três Marias com seus filhos e, parece que não sobrou nada”. Sutil, curto e rasteiro. O Presidente  dispensou meu pai de uma votação que ocorreria naquele instante e toda a família seguiu de carro com destino a Três Marias, em tempo recorde. As notícias não possibilitavam outra atitude. Àquela altura, eu já queria mais era esquecer todo aquele pesadelo. O piloto dormia, e dormia. Junto com alguns engenheiros, fui até a parte baixa da barragem para pescar. E lá, ficamos por algum tempo. Meus pais chegaram e abraçaram minhas irmãs, totalmente purificadas, diante de tantas promessas feitas, se tudo saísse bem daquela tormenta. E vem o desespero de minha mãe. “Onde está o Cláudio?”. Até que me encontrassem, ela viveu a sensação de perda eterna. Mas eis que surjo, sem nenhum peixe, para a tranqüilidade geral da família ALMEIDA.

Meu pai conversou por algum tempo com o piloto e decidiram que o avião seria levado de caminhão para Brasília. Ele pediu a meu pai que não o denunciasse, pois aquela era a única profissão que ele tinha e a família necessitava dos rendimentos dele, e coisa e tal. Mas meu pai disse que iria conversar com o Presidente da Novacap, e solicitaria uma nova função para ele, sem perda da remuneração de piloto. E assim foi feito. Menos vítimas em potencial. De resto, ficamos eu e minhas irmãs com essa história que agora lhes repasso, ainda com um dedinho de pavor, medo, angústia e outras coisas que naquele momento de horror a gente fala, faz e pensa.       





quinta-feira, 15 de março de 2012

Manoel José de Almeida em família


Comentários, mensagens e manifestações

lindo seus depoimentos, vc  expressou com o coração de criança e jovem/adulto. Lembro-me de um discurso proferido por seu pai, aqui, na faculdade, foi aplaudido de pé, pela capacidade e inteligencia. Bjs 
Vania


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QUE BELEZA. PARABÉNS. UMA HOMENAGEM A UM HOMEM QUE MERECE! COM CARINHO DA COSETE

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Oiii Claudio!!

Que legal os preparativos para essa celebração tão especial!
Pena que o anexo com o selo não chegou aqui...

Que Jesus abençoe vc e toda sua família!

Abraços,

Amanda



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Claudio queridooooo!!! Quantas saudades!!!!
Nossa, faz tempo que a gente nao se fala!
Esta tudo bem por ai, contigo?
Que maximo essa comemoracao!!! Eh o centenario do seu pai, nao eh?
Quero te dizer que fiquei muito feliz por voce estar compartilhando comigo este evento especial da sua familia. E parabens ao ilustre Manoel Jose de Almeida!!! Gostaria de conhecer um pouco da historia dele.
E a sua maezinha, como ela esta? Deve estar animada com a homenagem. E voce, o que tem feito????
Precisamos nos falar, de preferencia ao vivo e a cores, ne, Claudio.
Voce me manda noticias assim que puder? A ultima vez que nos falamos foi no seu niver, quando te liguei.... afff, mas parece que foi ontem, voce esta sempre no meu coracao, viu.
Um beijaooooo enorme e ate ja!!!!

Rica Osawa


segunda-feira, 12 de março de 2012

Depoimento de Cláudio Antônio de Almeida

A VACA BORBOREMA


Eu jamais esperaria que meu pai (MANOEL JOSÉ DE ALMEIDA), entrasse numa loja e comprasse um presente pra mim. Não só porque ele não levava jeito para a coisa, como o tempo dele era voltado para o trabalho. Tanto em Minas, quanto em Brasília, era inimaginável pensar que meu pai sairia com minha mãe, ou mesmo sozinho, e entrasse numa loja, e escolheria um presente para dar para uma pessoa. Nunca presenciei, nem jamais soube dessa acontencência. As vezes ele cometia umas delicadezas, que chegavam a assustar. Passando numa loja para comprar ração para animais, começa a olhar as coisa ao redor e vê um machado. Sim, um machado. E não é que ele aparece na minha casa com um machado e me presenteia. O machado em si não teve muita importância pra mim, mas o cartão que o acompanhou foi uma obra de arte. Uma dedicatória linda, explicando a importância do machado na lavoura, para o lavrador, enfim, passei a ver, a partir daquela data, o machado com um olhar diferente. Não só um instrumento de cortar árvore, mas algo que dá um alento ao homem do campo. É um instrumento de apoio ao homem. Eu ainda tenho esse machado. Troco sempre o cabo, mas o machado, sempre amolado, continua exercendo parte das prerrogativas que meu pai lhe atribuiu, em minha casa.
Mas surgiu um aniversário, de um dos meus irmãos. Não era o meu. Minha mãe preparou o bolo, os doces, etc., alguns convidados e a cantoria. Minha mãe, sempre prestigiou o Lamartine Babo, de quem privou amizade, quando o poeta/cantor esteve na terra dela – Boa Esperança, e fez aquela linda melodia: Serra da Boa Esperança. A música começa assim: “Saudemos o grande dia, que ele (a) hoje comemora, seja casa onde mora, a morada da alegria, o refúgio da ventura, ..  E por ai vai. E essa música faz parte do folclore musical dos aniversários de todos da  família. Todos entregavam seus presentes e meu pai, sai com um cartão, onde estava escrito: VALE A VACA BORBOREMA.
A tal da vaca borborema realmente existia. Meu pai tinha uma fazenda, na região do rio Urucuia, no norte de Minas Gerais, adquirida nos idos de 1950. Foi uma operação incrível à época. Ele tinha um carro Buick, o carro mais bonito que eu já vi em minha vida. Preto, enorme, com sotaque americano. Meu pai não sabia dirigir direito, e aprendeu, meio na marra. Havia muitos postes na minha rua, em Belo Horizonte e aquilo, creio que tranqüilizava, de uma certa forma, minha mãe. Uma hora, o carro para. Pois bem, meu pai viajando por aquelas regiões do norte de Minas, encontrou-se com uma pessoa extremamente interessante. Era o Sr.Saint Claire Valadares, o Coronel Saint Claire, dono de milhares de hectares de terra na região. Creio que ele não tinha idéia da quantidade de terra que tinha, muito menos quantas cabeças de gado existiam nelas. Mas enchia a boca pra dizer: não existe pra mim raça boa. Raça boa é curral cheio. É, cada um com a sua filosofia, de curral, mas pode se enquadrar em alguma interpretação mais pretensiosa. Mas a mulher dele fazia um peixe curimatan, que meu pai adorava e comentava com todo mundo sobre o sabor pisciano. Era um contador de histórias. E meu pai gostava de ouvir. Ali, naquela região, Joaquina de Pompeu foi proprietária de várias terras. Dizia o velho Saint Claire que ela se casava com o dono das terras e depois mandava matá-lo. Com o tempo ela já era proprietária de um vasta região à margem esquerda do Rio São Francisco. Dizem que suas propriedades chegavam até o hoje, Distrito Federal, onde era dona de uma fazenda chamada Papuda, onde existe uma penitenciáia. Diziam também que dessa mulher, muito foram os descendentes importantes na política mineira. Ela mandava os filhos, mais bem dotados, estudar no Caraça, um Colégio religioso, próximo de Ouro Preto. Ali se formou toda a geração de importantes políticos, banqueiros, proprietários rurais, enfim, a nata da política, da cultura e da economia mineira e brasileira. E tinha muita gente importante na lista de genealógica de Joaquina. Junto com D. Beja, de Araxá  e Chica da Silva, creio ser ela uma das mais importantes mulheres de Minas Gerais. Fez acontecer, mudou coisas, e como mudou.
A a conversa caminhou para outros lados e o velho Saint Claire, argumentando que a região precisava de um impulso. E nada melhor do que um homem como meu pai para tocar uma fazenda naqueles rincões. Meu pai não era de beber, mas se embriagou com as palavras daquele homem que dizia coisas lindas sobre as matas, a fauna, os rios, etc. E não é que meu pai fecha o negócio e compra a fazenda. Isso mesmo, vendeu o Buick e comprou a fazenda, que veio a se chamar “Três Marias”. Minha mãe não gostou nada da idéia, pois imaginava usar aquele dinheiro para aumentar a casa, pois já haviam nascido mais dois filhos e os quartos já não comportavam tantas crianças – seis. E agora, de posse da fazenda, tem que mexer, fazer lavoura, colocar umas cabeças de gado, etc. E assim, o tempo foi passando. Não é que anos depois, Brasília veio a ser inaugurada, em 1960 e, aquela fazenda ficava, relativamente próxima da Capital. A estrada era muito ruim, mas não desmotivava meu pai a colocar toda a família dentro de uma kombi e rumar para curtir as cachoeiras e os belos rios existentes na fazenda. E foi exatamente com essa fazenda que meu pai fazia o pé de meia para, em época de eleições, vender umas cabeças de gado para mandar fazer cédulas (era assim mesmo), e material de propaganda para as eleições e custear as campanhas eleitorais, que vieram a ser uma constante na vida da família. Não eram tantas cabeças de gado, mas de quatro em quatro anos, renovava e estava lá para bancar nova eleição. Vendia, vendia, mas a VACA BORBOREMA, sempre ficava lá, creio, pois ela era sempre objeto de presente de aniversário, natal, etc. Qualquer agrado, ta lá o bilhete: VALE A VACA BORBOREMA. A gente ficava com uma cara de tacho, mas achava tudo aquilo muito engraçado, pois, acompanhado do bilhete, vinha uma história, que creio, cada filho guarda para si com muito carinho. De lado, ficava meu pai com aquele sorrisinho maroto, de canto de boca, curtindo mais um aniversário.

CLÁUDIO ANTÔNIO DE ALMEIDA 


sexta-feira, 9 de março de 2012

Depoimento de Cláudio Antônio de Almeida



JOGO DE DAMAS


Mais um natal sem presentes. O reflexo era direto em minha casa. Todos os anos em que não havia recursos para comprar presentes para os meninos da “Caio Martins”, nós em casa, também ficávamos sem receber a dádiva de Noel. Os filhos de Manoel e Márcia eram um pouco, meninos caiomartinianos. Todos os finais de semana passávamos lá; era nossa rotina. Durante a semana, minha mãe ainda lecionava música e lá estava eu, durante a semana também. Eu sempre acompanhava minha mãe, pois, se ficasse em casa, com certeza iria brigar com os irmãos e, pra variar isso era uma constante. Morávamos em uma casa, apesar de grande, ficava pequena para suportar a energia de seis filhos. Hoje, me assusto quanto visito aquela mesma casa, e lembro que, inicialmente eram três quartos. Um dos meus pais, e os outros, divididos entre os homens e as mulheres. Até que minha irmã mais velha ficou mocinha e requereu um espaço maior para suas vaidades e veleidades. Mas eu continuava menino, apesar da diferença cronológica ser de apenas um ano. Mas ela levava uma vantagem enorme, pois, além de ser a mais velha, era vista por meu pai, com olhos muito especiais. Fazíamos aniversário, praticamente no mesmo dia, ela 30 e eu 31 de julho. No dia da comemoração dos aniversários, eu sempre tive a impressão de que não avisavam que também era o meu aniversário. E dançava no presente. Mas o caso aqui é o presente de Natal. Este sim, é o objeto dessa conversa.
Pois bem, não haveria presente de natal. Então, não tem objeto. Ficou estabelecido, mas haveria uma comemoração, pelo menos isso. Aquela coisa chata de ir à missa e ouvir aquela história contada todos os anos sobre o nascimento do menino Deus, já tinha sido dita. Mas eu ganhei do pai de um amigo da rua, um jogo de damas. Fiquei alucinado. Não tinha nada de especial e as pedras eram de matéria plástica. Mas pra mim, um sem presente, era lindo e era o meu jogo de damas.
Como todos os finais de semana, seguimos para a “Caio Martins”. No mesmo carro ia com a gente, o Padre José, gordo e simpático, que sempre ganhava umas galinhas das mulheres da região e as levava no carro, provocando aquele odor terrível. Mas ninguém reclamava. Apenas, o motorista, Paulo, que tinha que lavar o veículo. Mas o Dr. Maciel, que dava consultas e também aula de ciências no Curso Normal, também levava suas galinhas. Era um agrado, uma forma de pagamento, que ele jamais recusava. O Dr. Hilo, dentista, fumava um cigarrinho de palha, que apagava a cada minuto. E ele sempre tentava falar com o cigarro na boca, tornando difícil entender o que ele pretendia dizer. E o cheirinho da guimba era terrível. As vezes não tinha mesmo nada a dizer, mas era um homenzinho interessante, aliás, engraçado. Baixinho, já maduro, mas solteirão. Homem que mora com a mãe depois dos quarenta anos tem coisa, diziam e era o caso dele. Mas creio que ele veio a se casar. Ele implicava comigo, pois eu andava sempre com um mico no bolso. Mico estrela mesmo. Um dia levei o mico no consultório dele, em Belo Horizonte, para tratar uma cárie. Ele achava que era brincadeira, quando tirei o mico do bolso, pulou assustado, pra não dizer apavorado. Mas era apenas uma cárie, eu dizia, sem conseguir entender a recusa dele. Adultos ...
Levei comigo o meu jogo de damas. Chegava a limpar peça por peça, tal era o meu encantamento com o joguinho. Chegamos na Escola e fui direto para um dos lares, onde tinha meninos que regulavam com a minha idade – dez, doze anos. Ensinei pra eles algumas regras do jogo e passamos praticamente o dia todo jogando. A turma ia se revezando, e havia até torcida. Sério, tinha alguns que já vislumbravam duas a três jogadas na frente. Eram meus amigos. Os meninos me ensinaram a fazer botões, com matéria plástica. Botões para futebol de mesa. A gente amassava as tampinhas de refrigerante e colocava os pedaços de plásticos dentro. Fazia um fogo e o plástico derretia e ficava no formato de botão. Era meio rústico, mas até sofisticavam, colocando um plástico transparente por baixo e uma foto do jogador preferido. Na época, os principais times mineiros, eram Atlético e América, e ainda acredito que o são. Vivíamos completamente soltos na Escola. Tinha uma represa, onde a meninada nadava. Lembro-me de uma professora de artesanato, que gostava muito dos meus trabalhos. E eu circulava por todos os cantos da Escola. Nossa empregada, D. Maria Pinto, me procurava por todos os lares, para saber se eu tinha almoçado ou lanchado. O almoço era no próprio lar. Lá tinha um casal, e seus filhos também viviam junto aos demais meninos. Eram 23. Não sei o porque deste número. Mas tinha uma base de três a quatro por quarto. Não era muito diferente da minha casa. Deixei o jogo com os garotos e fui para a residência onde meus pais passavam o fim de semana. Era uma casa pequena, mas todos se acomodavam bem. Na frente tinha um bosque enorme, onde os garotos praticavam o escotismo. Ali também faziam churrasco e, me lembro, tinha um criatórios de coelhos e codornas.
Chega a hora de ir embora. Todo mundo esperando o Padre José acordar da sesta. E lá vem ele com suas galinhas dentro de um saco. Dr. Maciel, já bem velhinho, também trazia seus penados. E o Paulo, só olhava aquela carga extra entrando no carro. Era um carro muito grande, não me lembro a marca, mas era enorme. Tudo na nossa infância tinha uma dimensão muito maior do que viemos a constatar na idade adulta. Era o ângulo do olhar. A meninada me acompanhava e devolvia o meu jogo de damas. Meu pai sempre conversava com os meninos. Mas dessa vez estava conversando com muitos adultos. Algo estava acontecendo, mas nós nunca éramos informados dos problemas que afligiam os adultos. Quando os adultos ficam sérios, tem coisa ruim no pedaço. Minha mãe arranjava nossas roupas nas malas. Era muita roupa. Também eram muitos filhos. Não existia máquina de lavar. E D. Maria reclamava muito da quantidade de roupa suja. Finalmente, todos dentro do carro.
Eu me demoro um pouco, despedindo dos garotos e levando para o carro o meu jogo de damas. Meu pai observa aqueles movimentos e me chama para fora do carro. Cláudio, soube que você encantou a garotada com esse seu jogo de damas. Foi comentário principal do chefe-de-lar, de nome Lara. Um homem alto, muito claro, com os cabelos lisos e aloirados, de voz mansa e educado. Era militar. A garotada o respeitava muito. Mas não tinha idéia do que viria de meu pai, além desse comentário. Mas tinha muita coisa pela frente. No meio daquela meninada toda, meu pai pega o meu jogo de damas e diz: Meu filho, este não é um jogo para uma só pessoa, mas para muitas. Você não gostaria de dar esse jogo para os meninos? Puxa, era o meu jogo, o meu único presente de natal. Com o jogo eu conseguia me sentir o dono da bola. A meninada me via de forma diferente. Sei lá, tinha a senha do esconderijo, algo assim. Eu olhava para o jogo, olhava para os olhos das crianças e retornava o olhar ao meu pai. Sentia que, no carro, todos aguardavam a minha decisão. O que o Padre José estaria pensando? E se eu negasse? Creio que apenas D. Maria ficaria do meu lado, pois sempre foi minha cúmplice. Preta velha porreta, filha de negro com índio, bugre. Brava, mas do meu lado. Um silêncio se instalou entre aqueles olhares. Os olhos dos meninos brilhavam. Não era tirar a bala da criança, era muito mais. Era o meu bicho de estimação. Algo de muito especial. Mas o olhar de cada um mexia comigo e como mexia. Estiquei os braços e entreguei o jogo para um amigo especial, que tinha me dado um botão, feito de chifre de boi, e seria o meu beque central. A meninada comemorava. E eu? Entrei no carro enquanto todos conversavam sobre todos os assuntos, menos sobre aquela doação. Segui em silêncio até Belo Horizonte. Acariciava o mico, meu companheiro. Chegando em casa, meu pai entra no meu quarto e diz. Um dia você vai entender o tamanho da sua atitude. Realmente, hoje tenho essa dimensão. O educador atua em todos os momentos. E eu vivenciei um desses. 

quarta-feira, 7 de março de 2012

Depoimento de Claúdio - filho de Manoel José de Almeida

INFARTE????

A saúde de meu pai – Manoel José de Almeida, sempre foi uma preocupação para toda a família, e por extensão, nós filhos sempre vivemos sobressaltados com as constantes internações. Cheguei a imaginar que, na infância, meu pai teria sido picado por um barbeiro. Mas infarto mesmo, pelas informações médicas, a cada internação, ele nunca teve. Mas tudo tem sua primeira vez.
O segundo filho de meu irmão mais novo, João Lincoln, tinha acabado de nascer e estava tendo problemas com uma infecção hospitalar. Estava internado há dias e seu estado era cada vez pior. Era o Alexandre, de quem mais tarde eu viria ser padrinho e, que, bem mais tarde, seria meu genro, vindo a se casar com minha filha, Giovanna.
Naquela época, as passagens de avião eram de tirar o couro da gente e, a opção era enfrentar as 10 a 12 horas de ônibus, pé duro, de Brasília a Belo Horizonte. E foi assim que me desloquei para lá, quando recebi um telefonema do João, dizendo que o Alexandre não passaria daquela noite, conforme os médicos. Peguei minhas coisas e fui para a rodoviária e lá consegui um ônibus naquela mesma noite.
Sem tempo para passar no apartamento de meus pais, no centro da cidade, segui direto para o hospital, onde estava internado meu sobrinho, na periferia da cidade. Lá me encontrei com meu irmão, completamente derrubado, como se diz em Minas, demonstrando não dormir há várias noites. A criança parecia um ratinho. Cabia dentro de uma caixa de sapato infantil. Tinha a cabeça toda furada por agulhas de soro, pois não se conseguia mais outros lugares no corpinho para as transfusões. Num canto, vi a mulher do João, em profundo silêncio. As notícias não eram boas, ao contrário, eram derrotistas, sem qualquer expectativa positiva. Discretamente, João me chama para conversar fora do hospital. Imaginei que iria falar sobre o estado do Alexandre.
Mas nada disso, João fala de forma assertiva: você não vai ficar aqui. Papai teve um infarto em Esmeraldas. Acabei de falar com o médico e a situação é grave. São momentos em que você está em cima da ponte e ela está ameaçada de cai e você tem que decidir para que lado deve-se correr. Mas o João já havia traçado as coordenadas. Pegamos o carro e buscamos minha mãe em casa, seguindo para a Escola Caio Martins, onde meu pai se encontrava. Em uma hora chegamos e vi meu pai prostrado na cama, consciente, mas sem demonstrar reações de qualquer natureza. Ele me olhou de uma forma diferente dos olhares otimistas que eu estava acostumado a vislumbrar em seus olhos e não senti firmeza. Muitos alunos e professores se encontravam na casa e davam toda atenção a ele. Aproximei-me do médico, que era amigo de meu pai e que, nas eleições, sempre prometia a ele uma boa votação em Esmeraldas, mas que na verdade esse prestígio não se transformava em votos.  Mas meu pai gostava dele. Era um cara jovial, alegre, extrovertido e contador de história. E para o bem de meu pai, ele era especializado em cardiologia. Era tudo o que meu pai precisava naquele momento. Não me lembro do nome dele, não importa. Soube depois que ele se mudou para outra cidade.
E então o médico me diz de forma explícita - seu pai teve um enfarte do miocárdio. Estou aqui de posse dos eletro-cardiogramas, veja. Eu olhava aqueles rabiscos de baixo para cima, que não me diziam nada. E o médico contemplava a minha cara de imbecil total. Dava vontade mostrar um problema de macro-economia pra ele – sou economista, ninguém é perfeito, para ver qual seria sua reação. Minha mãe olhava para o João e João olhava pra mim. E aí, Doutor, o que fazer? Estou aqui pra colaborar no que for possível. Posso levar meu pai para Belo Horizonte agora? Jamais, disse ele; seu pai não tem condições físicas para se deslocar daqui para lugar nenhum. O estado dele é gravíssimo.
Mas Doutor, o que fazer então, se ele aqui não tem condições de atendimento, condizente com o estado em que ele se encontra. É, mas ele não pode sair daqui não. Ele não agüentaria chegar a Betim – cidade situada no meio do trajeto para Belo Horizonte. Fiquei desorientado, sem saber o que fazer, andando de um lado para outro, imaginando tudo o que me era possível para solucionar aquele impasse. Ultrapassava os meus humildes limites de raciocínio. Disse então ao médico que iria a Belo Horizonte pensar numa solução. O meu desejo era levar um médico, com os para-médicos e ambulância equipada, para atender a meu pai. Mas vamos ver o que existe pela frente. Despedi do meu pai, com os olhos. Foi uma troca de olhar triste, muito triste, aproximando-se de um olhar de despedida. Minha mãe ficou ao lado dele.
Chegando a Belo Horizonte, fomos direto para o Hospital, onde se encontrava o filho do João Lincoln. A situação da criança era a mesma – crítica. Meu Deus, o que fazer numa situação dessas? Um sobrinho terminal e o pai enfartado. Minha mãe também tinha saúde frágil. Mas num lance de HEURECA, João disse sem pestanejar: vamos arranjar um helicóptero. A primeira vista pareceu ser uma coisa descabida, até meio maluca. Não tínhamos acesso a esses meios de transporte e era, para mim, algo muito distante. Mas foi uma idéia. Como materializá-la!
A imaginação começa a fruir quando lembrei-me de procurar o cunhado de minha irmã, então Deputado, Paulino Cícero, que à época era Secretário de Educação do Estado. E para lá, rumei. Na frente da Secretaria havia uma manifestação imensa de professoras primárias, reivindicando tudo que era possível naquele dia. Tinha que ser. Eu não sabia nem como entrar na Secretaria. O clima era terrível, pois alguns funcionários, de forma estúpida, começaram a jogar água nas professoras.  A revolta se tornou odienta, fazendo com que as palavras de ordem mudassem para ofensas e outros impropérios impublicáveis. Mas, diante daquela situação, dei a volta e entrei pela porta dos fundos do prédio, buscando localizar o Gabinete do Secretário. A Secretaria funcionava em um prédio muito antigo, mas uma construção “art nouveau”, à época muito comum na cidade, uma influência da arquitetura francesa. As parede eram grossas e não haviam colunas. O teto continha pinturas já desbotadas, mas bonitas. Uma enorme escadaria me levaria até a parte superior. Lá, me identifiquei e disse ao funcionário que precisava falar com urgência com o Secretário. Argumentou que ele se encontrava numa reunião buscando uma solução para a greve dos professores e, uma saída honrável para aquele episódio do banho de água nos mestres. A repercussão eleitoral para ele seria catastrófica.
O funcionário entrou e retornou rapidamente, autorizando meu ingresso. Havia uma sala enorme, com uma mesa imensa de jacarandá, linda, rodeada de técnicos, assessores e pessoal da segurança, enfim, mais de 20 pessoas dando palpites e eu lá, tentando arranjar um helicóptero. Naquela época não havia telefone na Caio Martins, e muito menos celulares. Então, como saber do estado de saúde de meu pai. Paulino, como eu o chamava, me colocou sentado a seu lado na reunião e perguntou qual a razão daquela urgência. Relatei o problema do meu pai e o diagnóstico do médico-cardiologista, de que o estado de saúde dele era gravíssimo e sua remoção de automóvel, era impossível de se processar, pois ele não resistiria.  Paulino ficou preocupado e perguntou-me o que  estava pensando. Comentei com ele sobre o estado de saúde do filho do João Lincoln e disse sobre a sugestão apresentada por ele. Um helicóptero. O Secretário, a princípio meditou, por alguns instantes. Em volta dele aqueles homens cochichando uns com os outros e me sentia extremamente constrangido, pois havia presenciado aquela confusão na porta da Secretaria e a pressão sobre o Secretário era bárbara. Paulino mandou chamar seu Chefe de Gabinete,  mandando-o contatar com o Chefe do Gabinete Militar do Governador do Estado. Francelino Pereira era o Governador. Paulino conversou detalhadamente com o militar, por alguns momentos, dando uma prioridade zero ao meu problema. Disse ao Paulino que, caso meu pai piorasse imaginava leva-lo para Hospital do Coração, em São Paulo. Nem parecia que lá fora estava aquela tormenta, e, dificilmente aqueles professores arredariam o pé dali, sem uma solução definitiva. Paulino, concluiu a fala e me disse: o helicóptero está à disposição de vocês. Combine a rota a ser realizada com o pessoal do Gabinete Militar e traga seu pai para cá imediatamente.  Quando sai do prédio, olhei para o Secretário que tinha um semblante sério e contraído. Como agradecer? Só um abraço fraterno.  Para ele, muitas coisas ainda estavam por vir. Era um inferno em sua pasta. Quanto a mim, já existia um caminho traçado.
Com tudo o que eu precisava e queria, rumei para o Gabinete Militar e traçamos as coordenadas com os militares e o piloto. Peguei o João e fomos para a Caio Martins, situada no município de Esmeraldas. À época, a estrada era em grande parte de terra, e suas condições precárias. Encontrei meu pai deitado, totalmente vencido. Relatei a ele sobre a situação que o médico havia descrito e as providências tomadas para o seu deslocamento. Ele deu um sorriso: “que bom que as crianças da Caio Martins vão poder ver um helicóptero de perto”. Conversei com o médico, que se prontificou a acompanhar meu pai no helicóptero, juntamente com minha mãe. Mas o estado de saúde do Alexandre continuava crítico. Mesmo assim, João ainda me acompanhou até o Aeroporto para aguardarmos a chegada histórica do helicóptero. Quando avistamos o bichinho lá no ar, me emocionei. Descia meu pai, com um sorriso nos lábios, dizendo que a meninada estava toda feliz em poder conhecer um aparelho daqueles, de perto. Disse que o helicóptero pousou no campo de futebol da Escola, onde ficaram centenas de crianças e adultos, aguardando a saída do vôo. Foi uma festa, pela feição de meu pai, comentando. Conversei com o médico que ratificou seu diagnóstico em relação ao estado de saúde de meu pai - INFARTO. Antes, havia mantido um contato telefônico com a médica-chefe do Hospital do Coração em São Paulo, Dra. Maria Helena, jovem, bonita e elegante, para uma eventual necessidade de levar meu pai para a Capital paulista. Era ela auxiliar direta do Dr Adib Jatene, o papa da cardiologia no Brasil.
Mas tivemos uma agradável surpresa. A Chefia de Gabinete, mantendo contato com o Governador, autorizou o envio de um avião do Estado para conduzir meu pai até São Paulo. João e o médico ficaram em Belo Horizonte e seguimos, eu, minha mãe e meu pai para a Capital paulista. A viagem foi tranqüila e rápida. Nunca me senti tão prestigiado. Estava acima do bem e do mal.  Já prevendo o problema do trânsito em São Paulo, entrei em contato com meu sogro, à época residindo em São Paulo, pedindo-lhe que nos pegasse no aeroporto. Assim, o fez e seguimos direto para o Hospital do Coração. Fomos recebidos pela equipe de cardiologia do hospital, pois as notícias da saúde de meu pai já haviam chegado antes de nós. Logo fomos alojados em um apartamento, mais bem equipado do que qualquer UTI de hospital de Belo Horizonte. Realmente, um excelente nosocômio. Meu pai foi levado a fazer uma bateria de exames, durante todo o dia enquanto eu e minha mãe aguardávamos no apartamento. Uma gripe forte, começou a tomar conta dela. Mais essa. Ela estava muito fragilizada e eu precisava que ela estivesse bem para acompanhar meu pai, pois eu teria que providenciar a papelada para a internação de meu pai. Eram documentos de INPS, seguro saúde, enfim, coisas que o hospital exigia para a internação e, naturalmente o ressarcimento das despesas, que ali, não seriam poucas. Mas minha mãe piorava cada vez mais e terminou prostrada na cama do hospital, tendo eu que chamar médicos para atende-la.
Mas a expectativa em relação aos exames era cada vez maior. O quadro pintado pelo médico de Esmeraldas era o pior possível. Comuniquei a todos os irmãos a situação de meu pai, para que se preparassem para o que pudesse a vir a ocorrer. Meu pai parecia ser o mais tranqüilo de todos. Estava com uma fisionomia boa e se alimentava bem. O problema agora era D. Márcia, com aquela gripe fora de hora.  Eis que entram no apartamento o Dr. Adib Jatene, Dra. Maria Helena e mais uns três homens de branco, que imaginei serem também cardiologistas. Olhei para Maria Helena e ela sorriu. Era difícil àquela altura interpretar aquele sorriso. Nem Mona Lisa tinha aquele sorriso. Indescritível. Dr. Jatene se aproxima do leito de meu pai e diz. O SENHOR NÃO TEVE INFARTO !!!!!!  Eu não entendi nada. Havia levado os eletros e entregue, juntamente com outros exames e descrição de procedimentos realizados, ainda na Caio Martins. POIS É, confirmou ele, NÃO FOI INFARTE. O senhor tem o coração bastante dilatado. Se tivesse que fazer algo, seria um transplante, mas isso seria em última hipótese. Olhei para Maria Helena e entendi o seu sorriso. Ela acompanhou meu desespero em todos os momentos em que estive no hospital. Ela almoçava e lanchava no hospital e sempre nos encontrávamos para falar sobre o episódio. Despediram de meu pai e deixaram o apartamento. Ficamos, eu, minha mãe e meu pai olhando um para a cara do outro. Patéticos.
E AGORA? O que vamos dizer pra todo mundo. Pro Governador, pro Secretário, pro João Lincoln, para os irmãos, para os alunos e funcionários da Caio Martins, para a criançada que viu meu pai sair num helicóptero. E o médico, como é que vai ficar nessa história. Falamos e falamos e meu pai ouvia e esboçava um sorriso jocoso. Acho que ele foi o único a curtir todo aquele estado de coisas. Vendo que não havia uma solução plausível para o caso, convenci meu pai a assumir toda aquela história. Para todos os efeitos, ele o senhor teve um INFARTO. Vai passar uma temporada aqui no hospital e depois vai para a casa de minha irmã, em Bragança Paulista, curtir o descanso merecido do velho guerreiro.
Mais tarde, ligamos para os irmãos dando boas notícias, e recebemos a informação do João de que o Alexandre teria recebido alta no hospital.
Mas são tantas as histórias, lembranças interessantes, até engraçadas, outras tristes, na trajetória de vida de meu pai, mas, com certeza posso dizer que sinto-me orgulhoso ao falar que sou filho de um POLÍTICO. O POLÍTICO MANOEL JOSÉ DE ALMEIDA.

CLÁUDIO ANTÔNIO DE ALMEIDA – segundo filho do casal Manoel de Almeida/Márcia Almeida. Economista e Advogado.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Depoimento de Ana Maria Lopes


Ele vinha com aquele andar de pés aberto. Sempre uma pasta de papel em baixo dos braços. Nas pastas, seus sonhos. E caminhava com a calma dos sonhadores.

Essa é uma imagem recorrente quando penso em Manoel de Almeida. Seus sonhos eram tão fortes e verdadeiros que nada o perturbava. Nas pastas, dezenas de projetos de lei em benefício da criança carente e abandonada. Páginas de discursos, anotações, recortes de jornais e projetos. Muitos.

Aquelas pastas, organizadas com uma ordem muito pessoal, só ele as entendia. Ao redigir ou ditar um discurso, parava por segundos e tirava de dentro daquela babel de papeis, uma anotação tão precisa, tão correta, que arrematava seu pronunciamento com fecho de ouro.

Nada o tirava de Minas. Sua mineirice aparecia na simplicidade que o acometeu a vida inteira. Um homem que falava e vivia com sua gente. Nem mesmo em andanças pelos palácios da República, Manoel de Almeida se desvestia de sua simplicidade.

O melhor exemplo do que falo aconteceu em uma tarde em seu gabinete na Câmara dos Deputados. Ele esboçava seu relatório da CPI do Menor. Ao seu lado, além das colunas de papel, uma pequena cesta com tangerinas que trouxera de um pequeno sítio em Taguatinga.

Pela porta de vidro vi que um homem baixo e meio cabisbaixo caminhava na nossa direção. Quando ele chegou perto vi que era o então deputado Tancredo Neves – ex primeiro ministro da nossa rápida passagem pelo parlamentarismo, ex senador, ex ministro e tantos cargos mais -.  Corri para a sala onde Manoel de Almeida estava para avisar da ilustre visita. Não deu tempo. O também mineiro Tancredo Neves, que viria a ser presidente do Brasil como candidato da Aliança Democrática, entrou sem maiores avisos. Os dois se cumprimentaram e eu fui correndo avisar à copa para levar café e água. Mas nada de copos de plástico, por favor! Usem o serviço de louça, pedi.

Voltei ao gabinete quase ao mesmo tempo em que chegavam a água e o café, como pedira. Ao entrarmos na sala – o garçon e eu – não acreditamos no que vimos.
Manoel de Almeida e Tancredo Neves conversavam relaxados no pequeno sofá do escritório e os dois – sim, os dois – descascavam e comiam tangerinas como meninos em recreio.

Aqueles dois mineiros viviam ali a sua simplicidade. E o cheiro da fruta, as cascas colocadas em cima de uma folha de jornal e a conversa política sem rodeios, virou para mim a imagem do homem: Manoel de Almeida



                             Ana Maria Lopes